God, um dia inteiro, uma personalidade admirável,
Você acorda em um dia útil. É cedo, bem cedo. Terá um dia inteiro de trabalho pela frente. Mas a cama está tão gostosa! Parece que ela e você são um só. Virar para o lado depois do despertador tocar e ficar mais um pouquinho é uma proposta que você faz a si mesmo. E ela parece irrecusável. Você tinha de ir à academia, mas um argumento vem à sua mente: “Um dia a menos não mata. Eu mereço ficar mais um pouquinho.” E fica.
Chegou atrasado ao escritório e isso gerou correria extra na parte da manhã, mas a hora do almoço foi melhor. Comida muito boa. Depois veio aquela sobremesa espetacular. Um pedaço generoso de torta. E outra fatia está ali no balcão do restaurante. Reluzente e cremosa. Parece que chama você lá da cúpula de vidro. “É minha”, você se diz. E come mais uma.
Após o farto almoço, uma caminhada pelo shopping. Já é a segunda vez que aquela camisa na vitrine o atrai. É cara. Com a mesma grana, você compraria três ou quatro de boa qualidade de outra marca. Acontece que essa é da tal grife famosa que os caras de Londres e Nova York usam nas fotos das revistas. Você pensa: “Ah, tudo bem fazer em algumas vezes no cartão de crédito”. De novo vem o “eu mereço” e lá se vai o dinheiro da matrícula daquele curso de línguas planejado, agora adiado para o próximo bimestre.
Meio da tarde. Aquela colega de trabalho foi de novo com roupa justa e decotada. Os olhares dela não parecem só um convite, mas uma intimação. Quem sabe um happy hour diferente num motel antes de ir para casa ver a patroa e as crianças? Dá para se sentir mais macho, ter mais cartaz com a galera. Ô, pegador! Vai deixar passar essa?
Essas atitudes parecem as de um homem? Depende do tipo de homem que falamos. “Ah, ele tem amor- próprio e aproveita o que a vida tem de bom”, vai dizer alguém. Será mesmo? O que é esse “amor-próprio” em questão?
Acontece que o cérebro tem um recurso chamado sistema de recompensa. Ele se sente gratificado com algumas coisas que você faz, mas é uma satisfação momentânea. Um capricho. E nessa ânsia de satisfazer esses caprichos entra também o consumo de drogas, por exemplo. O sujeito deixa de usar o cérebro todo e privilegia só a sensação de recompensa e suspira aliviado por poucos instantes. Só que o tal sistema depois quer mais. E mais. E por aí vai.
Um cara que tem amor- próprio de verdade sabe que uns minutos a mais de sono são bons na hora, mas não fazem tão bem quanto uma sessão de academia, benéfica também a longo prazo. Sabe que comer bem é ótimo, desde que isso não faça sua barriga avançar alguns furos no cinto e seu colesterol escalar o Monte Everest.
Sabe que é bom andar bem vestido, mas que as finanças pedem que se leve em conta o senso de prioridade. Que uma pulada de cerca engana e parece fazê-lo se sentir macho, mas não homem – sim, são coisas diferentes – e pode custar o casamento, a confiança da esposa e o convívio diário com os filhos.
Então, a diferença é exatamente essa. O primeiro homem só se agrada, enquanto o segundo se ama. Quem se ama de verdade, se cuida. O primeiro dá presentinhos ao próprio ego, que logo se esvazia. Este, por sua vez, constrói uma personalidade admirável, dia após dia. E cada escolha, cada atitude, conta na soma final.
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